quinta-feira, 21 de abril de 2011

QUANTO VALE UM SORRISO



Regina Ramos dos Santos
Véspera de domingo de Páscoa. A jovem caminha sem vontade rumo ao supermercado. Os últimos preparativos do feriado haviam determinado algumas compras. Na verdade, nada de importante.
Ela não gostava das datas consideradas “especiais”. Achava-as monótonas e interesseiras, porque, para ela, a essência de todas era apenas o apelo comercial. O significado religioso, infelizmente, há muito tempo fora deixado para trás.
Duas crianças sujas e maltrapilhas sentadas na calçada chamaram-lhe a atenção. Não deviam ter mais do que oito anos e, naquele momento, repartiam o pão que acabaram de ganhar.
A fome certamente conferia ao alimento divino sabor, porque não pareciam notar as pessoas que transitavam ao redor. Mas logo o pão acabou e elas voltaram a fixar os olhinhos vivos e brilhantes nos transeuntes, certamente à espera de mais donativos.
“Que vida!” – pensou a jovem. Infelizmente, aquelas crianças representavam parcela significativa da população brasileira. Ironicamente, habitantes de um país muito rico, mas que, assim mesmo, permitia que muitos dos seus filhos passassem fome e toda sorte de privações.
Mas que podia fazer? Grandes problemas sociais carecem de abrangentes políticas públicas. Portanto, eram responsabilidade do governo e não de simples mortais como ela. De repente, uma ideia mudou o rumo dos tristes pensamentos. Por que não pensara nisso antes?
Rapidamente, entrou no supermercado, comprou tudo o que precisava e algo mais. Como era de se esperar, o estabelecimento estava cheio, de modo que demorou a livrar-se da fila do caixa. Não via a hora de chegar à rua e reencontrar as crianças.
Os pequenos estranharam, quando ela parou e, sorrindo, ofereceu um ovo de Páscoa para cada um. Os olhinhos brilharam ainda mais, porque não esperavam por aquele presente. E ela sentiu-se ainda mais feliz, por saber-se responsável por toda aquela alegria.
Já havia se afastado um pouco, quando ouviu as crianças chamando-a:
- Moça! Moça!
Olhou para trás e viu que, a elas, haviam se juntado mais três. Sabia o que queriam e não as decepcionou.
- Já volto! – foi a resposta.
Retornou ao supermercado para comprar mais ovos. Desta vez, a multidão e a fila não a aborreceram.
Voltou a pensar na responsabilidade dos governantes. No entanto, o fato não isentava as pessoas em geral do dever de serem solidárias e humanas. Gestos despretensiosos como o seu certamente não mudariam a situação daquelas crianças, mas foram capazes de fazê-las sorrirem. E isso não tinha preço...
Concluiu que as oportunidades de fazer alguém feliz aparecem o tempo todo na nossa frente. Aprender a percebê-las e aproveitá-las só depende de nós. Neste caso, o maior beneficiário não é quem recebe o benefício, mas, seguramente, quem o proporciona. Quem pratica sabe. E, a partir de agora, ela também sabia.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

ESCREVA!

Jacqueline Aisenman

Não se preocupe com o pecado das letras e nem com a militar formação das frases. Escreva. Não busque os olhos críticos, tente encontrar os corações. Esqueça os títulos e as graduações, lembre do sentimento puro dos que muitas vezes nem são letrados. Escreva. Rime e brinque, crie, desconstrua, invente, seja poesia e faça poemas de vida. Escreva. Conte o seu dia, o momento do amigo, a saudade do pai. Escreva. Crie personagens, dê-lhes vida, conte histórias. Escreva. Mostre. O perigo não está em alguém não gostar do que você escreveu, nem no estilo, nem nos erros. O perigo está em você não deixar livre sua alma, está em se preocupar com o que os outros fazem, em pensar que existe melhor ou pior. Escreva. Seja você em cada linha, seja cada palavra, viva tudo o que escrever, seja na vida ou na imaginação. Viva. Escreva.

E deixe as críticas para os que não tem nada a dizer...

segunda-feira, 18 de abril de 2011

O PEDREIRO ESCRITOR




Maria de Fatima Barreto Michels

Muito atento ao seu trabalho, ele estava sempre lá. Fazendo o piso, assentando tijolos, colocando tubulações, reboco e revestimento cerâmico. Sem elevador, subíamos seis andares diariamente, acompanhando e fotografando a obra. Achei interessante a superfície daquele banco. Sobre aquele tosco banco o Manoel recortava com a  serra mármore, ou maquita como ele dizia, os pisos e azulejos nos tamanhos necessários.
A tábua que formava a parte do assento do banco estava a cada dia  com mais sulcos, linhas retas que se cruzavam. Ali também ficavam pequenas porções de massa que respingavam quando o pedreiro subia para fazer o emboço na parte mais alta da parede da churrasqueira. Comecei a clicar semanalmente o banco e o fazia em horários diversos para obter tons que variassem. Com alternadas posições do sol no bairro Mar Grosso, eu ficava observando a história que, numa  linguagem diferente, ia sendo escrita na madeira daquele banco.
Em outro continente, na cidade de Genebra, uma escritora também criava, digitando no computador, as suas linhas.
Antes de eu começar a observar a construção, outros homens já haviam trabalhado muito por ali, finalmente vieram o pintor, o carpinteiro, e o eletricista e todos eles continuaram a utilizar o banco.
Muitas pessoas trabalhavam e cada qual ia deixando seu autógrafo, naquele prédio. Lá da Suíça a Jacqueline convidava poetas e contistas, através da internet, para que juntos erguessem uma obra em forma de palavras. Um dia a escritora contratou a publicação dos textos de 38 brasileiros, dos quais entre ela uma dezena de lagunenses.
Eu e Isabella, estudante de design industrial, sugerimos fotos diversas para a capa do livro, mas para nossa surpresa, entre flores, céu e mar a editora escolheu justamente uma parte daquele assento de banco que reunia muitas marcas. Tais riscos, na imagem fotográfica, convergem para uma rachadura que há na tábua. A fresta forma uma linha que liga horizontalmente ou, pode-se dizer, na qual estão dependurados muitos dos sinais de uma especial semiótica da construção civil.
O livro se chama Varal Antológico,porque ele nasceu da revista virtual Varal do Brasil e trata-se de uma coletânea onde estão reunidos muitos autores. Fundamentada “numa relação de semelhança subentendida entre o sentido próprio e o figurado” poderíamos dizer que a fotografia, na capa do livro, conseguiu estender um metafórico varal. Um fio que começa com a escritora lá na Europa e vem até o pedreiro aqui no Brasil. Impossível aqui não me lembrar do filósofo e educador Paulo Freire:  “Não há saber mais ou saber menos: Há saberes diferentes.”
Diferentes meios e formas de expressão: na obra civil as ferramentas, na literatura as palavras. A foto da capa é o comprovante dos inúmeros operários que naquele banco nos ajudaram a estender o VARAL ANTOLÓGICO.
Quem não gosta de poesia? Quem não precisa de um varal?

sexta-feira, 15 de abril de 2011

O PARQUE DA CARIOCA

Dulce Claudino



A límpida água que jorra da fonte
Que encanta o turista e refresca o viandante
Numa manhã julhina desperta viçosa
Transparente, maculada, modesta e silenciosa
Aguardando a locução solene:
" A Fonte da Carioca é reinaugurada ".

Efusivos aplausos, fogos, descontração,
Sorrisos alegres enfatizam o desenlace da fita
Ao som musical da banda União dos Artistas
Nativa deste chão.

Recipientes acolhem a água cristalina
Refrescando os lábios ressecados pelo vento sul cortante
Que rasga os ares , levando consigo
As desalinhadas folhas num voo razante.

Os pés são firmados nas pedras ,que servem de fundo ao tablado
Olhando para o alto, o azul do céu, cede o lugar ao tom das folhas ,
Que forram o teto , cor verde cerrado.

As pessoas caminham sentindo o aroma das plantas silvestres,
Do ar despoluído, da seiva da terra.
Faceiras adentram ao âmago do parque,
Novo ponto turístico, harmonizado às belezas que Laguna encerra.

PARQUE DA CARIOCA, assim batizado
O recanto da felicidade, dos aromas, dos desejos...
Da água que une os enamorados , que afiança o príncipe encantado
Como dito popular, crê-se profetizado:
" Beber da água da Fonte da Carioca é eternizar o amor sonhado".

segunda-feira, 11 de abril de 2011

ESTRELAS

Márcio José Rodrigues 
 

 
Estrelas são meninos
A brincar nas alamedas do céu.
Estrelas- meninos
Imaculadas
Limpas
Puras 
Luminosas
Intocáveis
Inalcançáveis.


Quem te deu tanto poder,
Que podes tocar nossos meninos
Com tuas mãos sujas?
Tu que aprovas as leis
Para teu uso pessoal,
Tu  os corrompes em sua pureza
E deixas que os corrompam
Com tua negligência
Com tuas mentiras
Teu desprezo
Tua arrogância.

Semeias rancor nas searas
Onde antes só cresciam
Inocência, igualdade, paz.
Tu que inventaste estrelas
Negras...
Pardas...
brancas...
Semeias um ódio novo
E vais colher
Estrelas mortas
Nos campos do céu.

BEM ME QUER


Por J.Machado

A VIDA NOS OFERECE
FLORES,
SABORES,
AMORES,
A BELEZA DAS CORES.

QUANTO MAIS VIVEMOS,
MAIS QUEREMOS,
MAIS APRENDEMOS,
MAIS ARRISCAMOS.

DE QUE VALE A VIDA SEM
O RISCO DE AMAR,
DE APOSTAR,
DE PERDER OU GANHAR?

APOSTEMOS NA GRAÇA,
NA SORTE,
NO BEIJO NA PRAÇA.
NO MAL ME QUER
NO BEM ME QUER

quinta-feira, 7 de abril de 2011

A FORÇA DOS VENTOS

Jacqueline Aisenman





Um vento que vem
do sul
do nordeste
do leste
um vento que vem
que balança os cabelos
que derruba os varais
que levanta ondas no mar...
um vento que vem
e refresca o calor dos dias
e atiça o humor mais calmo
e enfeitiça o ser que passa...
um vento que vem
que vai
que é frescor ou ventania
alivia ou vira furacão...
um vento, dois ventos, três ventos...
e uma barra sedenta se banhando no mar
e um mar sequioso se jogando na areia
e um farol alertando
o barco que vem
o pescador que se aventura...
vai lá
não vai
vai lá
não vai
vem cá...

(Foto de Maurício Drunn, Praia da Tereza)

domingo, 3 de abril de 2011

VARAL ANTOLÓGICO TEM PARTICIPAÇÃO DE MEMBROS DO CARROSSEL

O livro Varal Antológico, primeira coletânea impressa da Revista Varal do Brasil, contará com a participação de vários membros do Grupo Carrossel das Letras: Márcio José Rodrigues, Dulce Claudino, Maria de Fátima Barreto Michels, J. Machado, Flávio Goulart Barreto e Jacqueline Aisenman.
A capa, aqui estampada, tem arte de Isabella Sierra sobre foto de Fátima Michels.
O lançamento do livro será em Florianópolis na sexta-feira 13 de maio de 2011, às 19h30m na Livraria Catarinense do Shopping Beira-Mar.